DE SOFOMANÍACOS E GREGOS, TODOS NÓS TEMOS UM POUCO

A era da sofomania chegou. Palavrinha engraçadinha e de sonoridade suave que encerra em seu significado doses elevadas de soberba, vaidade e autoengano. Uma mistura bem indigesta que parece ter encontrado o ambiente perfeito para fermentar as redes sociais.

Comportamento muito presente hoje, a sofomania consiste em tentar se passar por inteligente, mesmo sabendo que não se é. Uma ação consciente, calcada na afetação permanente e na confiança excessiva sobre a própria sabedoria.

O problema é que, onde há sofomania, via de regra, há pouco ou quase nenhum lastro de conhecimento. O pensamento do sofomaníaco é raso, horizontalizado. E, portanto, o que é dito por ele não frutifica. Não engrandece os diálogos. Suas palavras vão do cômico ao trágico em segundos. Com eles não tem conversa possível, viável. Existissem eles com tanta ousadia na Grécia Antiga, os filósofos gregos teriam perdido a paciência em Ágora, deixando um legado consideravelmente menor.

Isso porque o conhecimento de um sofomaníaco não é construído. Não acumula informações e as processa. Não correlaciona dados. Não é fruto de pesquisas e estudos próprios. Ele se edifica sobre informações que lhe chegam sem querer ou, talvez, lhe sejam encaminhadas justamente por sua condição sofomaníaca.

Afinal, entre tanto pensamento a ser controlado e condicionado atualmente pela internet, qual seria melhor que os dos sofomaníacos? Um público-alvo cordato, sem iniciativa e prontamente subserviente ao próprio ego. Com um parâmetro de profundidade de conhecimento tão sutil que qualquer informação errada ou distorcida pode flutuar por horas sem naufragar. Bem à vista dos mais desavisados e daqueles que, mesmo não sofrendo de sofomania, a preguiça impede o pensamento crítico próprio.

Na cabeça de um sofomaníaco há um contínuo processo mental que faz com que ele aceite, em um determinado momento, uma informação como verdadeira. Mesmo que, em um momento anterior ou posterior, ele já tenha compreendido ou venha a compreender que ela é falsa. E, quando isso acontece, nada acontece… Porque a fidelidade do sofomaníaco à sua total ignorância é máxima. Por aquilo que ele acha que sabe e finge acreditar ele é capaz de matar ou morrer. Enfrenta Platão tal qual Aristóteles. Mesmo sabendo que nem de longe possui a mínima capacidade aristotélica para tal.

Sendo assim, talvez não seja exagero suspeitar que a sociedade brasileira está à beira do caos filosófico. A sofomania estagnou as reflexões sociais, prendendo em um looping os usuários de redes sociais e outros aplicativos de convivência sem permitir que os debates fundamentais avancem.

Não bastasse o desgaste nas relações humanas simples, agora a sofomania subverte a ordem teórica da comunicação. A máxima “uma mensagem, um emissor e um receptor” não corresponde mais à realidade. Uma vez que o emissor emite apenas mensagens equivocadas, o receptor não consegue contestar a mesma. O diálogo se rompe. Perde o propósito e a função. E por que não dizer, perde a linha. Se transforma em debate sem argumento. Discurso sem preparo. Conversa sem pé nem cabeça.

Sim, a sofomania é uma das muitas loucuras do mundo contemporâneo a ser discutida, enfrentada e combatida enquanto há tempo.

Afinal, sofomaníacos existem, não são poucos e se autoenganam diuturnamente. E fazem isso muito bem. Tão bem que, após a hecatombe, é possível que sobrem apenas as baratas e os sofomaníacos com suas convicções perturbadas.

Convicções essas pelas quais, tal qual na Grécia antiga, eles estarão dispostos a sacrificar cem cabeças de boi aos deuses mitológicos para perpetrar discussões estapafúrdias. E já que, na mesma antiguidade grega, há melhores exemplos de construção da sabedoria, é uma pena que quem nasceu para sofomaníaco nunca chegue a peripatético. Aí sim, poderíamos ter esperança das redes sociais contribuírem com a sociedade brasileira.

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RACHEL CRESCENTI

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